Gilmar França

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sábado, 23 de junho de 2012


Artigo: Mártires de um Brasil doente

22 de junho de 20128
Túlio Meyer Graziottin*
Todo mundo tem diariamente os seus próprios conflitos freudianos, no entanto alguns afloram com força, vencem os aparelhos repressores da consciência, e clamam por um debate mais aprofundado. A questão da saúde no Brasil é um dos temas que não pode deixar um cidadão calado, seja ele quem for.
Reporto-me à recente matéria veiculada na imprensa a respeito da espera para atendimento em setores de emergência pediátrica. O depoimento de pais que se deslocaram da grande Porto Alegre para atendimento na capital e esperaram às vezes ao relento seis, 10, 12 horas por atendimento, não pode deixar qualquer pai que é contribuinte neste país sem um veemente grito de protesto.
Sou professor de medicina e de uma universidade pública e seremos responsáveis pela formação de uma parte dos médicos que servirão o país nas próximas décadas. E confesso, com a devida vênia, que estou com problemas em transmitir para os futuros médicos o conhecimento técnico-científico adaptado à nossa realidade.
Tenho contato com ambas as saúdes, pública e privada, e certamente estas não estão saudáveis. Não se pode permitir que uma mãe espere 12 horas por atendimento, com seu filho doente no colo, sem dinheiro para alimentação e em contato com outros pacientes ainda mais doentes. Não se pode permitir que um paciente com câncer ou com risco de perder um órgão, com uso de cateteres e sondas, espere por 6 meses, às vezes um ano, por uma cirurgia. Ou negar um exame diagnóstico, tratamento de ponta, ou internação hospitalar para um paciente que os necessita. Não se pode alijar os pacientes do direito de serem tratados dignamente quando se está mais vulnerável.
Na universidade e nos ambulatórios, quando debatemos o tema proposto, surpreendo-me frequentemente que poucos estudantes se manifestam; ouvintes calados e estupefatos, que se surpreendem, mas não sabem o que fazer. O mesmo deve ocorrer em outros ramos da sociedade, não me surpreenderia.
Pergunto-me, evidentemente, o que está acontecendo conosco. Penso que deveríamos ter uma consciência crítica e aguda sobre o tema. Não esperaria, como me foi comentado, que o próprio doente se rebelasse contra o sistema. Esta é a parte fraca, isolada, desassistida, que vive um drama para ter sua doença mitigada, a dor sanada, o sangramento estancado, a falta de ar solucionada.
Esperaria sim uma resposta contundente da sociedade sã e que tem força e capacidade para se rebelar contra um sistema que deixa muito a desejar, tanto público como privado. O que nos falta então, e qual a solução? Difícil dizer, porque muito tem sido debatido na imprensa e nos fóruns competentes. No entanto, o debate prolixo deixa de solucionar umproblema que não pode esperar mais. Falta-nos, como coletivo, mais indignação.
E o que tem a dizer aos que tem a chave do cofre? O que mais se ouve é a transferência de responsabilidade, mas pouca ação. O que não se pode aceitar é misturamos o sofrimento da doença com desassistência e irresponsabilidade. Meus compatriotas, quisera o país reverenciar seus verdadeiros mártires, dever-se-ia render homenagem aos pacientes que necessitam de assistência médica neste país.
*Professor de Medicina da UFCSPA
Fonte: Zero Hora

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