O dinheiro saiu dos cofres da União, mas o governo não tem pistas de onde foi parar. O caso aconteceu 1.641 vezes apenas em convênios assinados pelos ministérios da Saúde, da Educação e dos Transportes desde 2007. Os prefeitos nunca deram satisfação sobre o destino das verbas, liberadas para ações como a construção de hospitais, escolas e estradas. Mesmo assim, jamais haviam sido processados pelo crime de não prestação de contas, cuja pena pode chegar a três anos de prisão.
O Ministério Público Federal (MPF) montou agora uma força-tarefa para tentar drenar o ralo dos repasses aos municípios. O grupo de trabalho, batizado de GT Corrupção, já apresentou denúncias contra 37 gestores e tem outros 164 inquéritos em fase de conclusão. Agora, o objetivo é ir a campo para verificar o que foi feito com os recursos. "A corrupção está entranhada nas áreas de educação e saúde, que quase sempre são financiadas pela União", diz Raquel Dodge, subprocuradora-geral da República.
"Os prefeitos sabem que têm de prestar contas, mas em muitos casos a desfaçatez é notória", afirma.
Só em convênios para a compra de veículos para transporte escolar, os municípios deixaram de prestar contas do uso de R$ 21,6 milhões, aponta levantamento dos procuradores. Outros R$ 6,4 milhões deviam ter sido empregados para erguer escolas, mas não há registros de sua aplicação.
Além da falta de fiscalização, o foro privilegiado alimenta a impunidade dos maus gestores. O país tem 5.565 municípios, mas os prefeitos só podem ser processados por desvio de verba da União nos cinco tribunais regionais federais. O maior deles, com sede em Brasília, é responsável por julgar todos os casos descobertos em 13 Estados.
"É quase impossível condenar um prefeito no cargo. Muitas vezes, a denúncia chega quando o crime já prescreveu ou o mandato terminou", diz Raquel Dodge. Se o acusado deixa a prefeitura antes do julgamento, o processo é remetido à primeira instância, onde o trabalho começa novamente sob a responsabilidade de outros procuradores e juízes.
"A corrupção nos municípios é perversa porque afeta quem mais precisa dos recursos", diz Janice Ascari, procuradora regional da República e coordenadora nacional da força-tarefa. "Quando o prefeito pega a verba federal e não cumpre o objetivo do convênio, prejudica os habitantes da cidade e os demais contribuintes."
Folhapress - 03/09/2011)
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